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sábado, agosto 30, 2003

Um amigo  

Perguntam-me por que é que eu mantenho uma ligação tão forte com a minha terra e eu respondo: os amigos. E acrescento: os amigos do meu pai. E ainda faço uma precisão: os amigos de infância do meu pai. Os poucos a quem, apesar de não partilharmos o mesmo sangue, tratarei sempre por tios - e que me ensinaram quase tudo o que sei e sinto sobre a amizade. O meu pai e eles não se viam diariamente. Direi até: nem mesmo com regularidade. Mas, sempre que se encontravam, não circulava entre eles o ar espesso e pesado da distância. Não havia artificialismos nem conversas de ocasião. Em pequeno, costumava juntar o meu incipiente vulto ao deles – alinhava, ainda de madrugada, nas caçadas e pescarias, acompanhava-os na altura das visitas às casas uns dos outros, quase sempre sem necessidade de avisos prévios, e ouvia as suas histórias de juventude, com namoros, motas e Beatles à mistura. Mais tarde, sobretudo quando passei da adolescência à idade adulta, transferiram algum do afecto que sentiam pelo meu pai para mim – começaram também a tratar-me como amigo, um dos chegados. Há uns anos, andava eu em apuros comigo e com o mundo, um deles apanhou-me numa festa de casamento, agarrou no meu braço e levou-me para um passeio. A certa altura, falou-me num tom ao mesmo tempo triste e apaziguado: “Aquilo que o teu pai te tem dito sobre o curso e sobre a vida, em geral... Olha que ele tem razão...”. Nessa altura, o tamanho da barriga e a cor amarelenta dos olhos denunciavam-no como estando muito doente – um ano depois veio mesmo a morrer, em circunstâncias trágicas que não interessa aqui recordar. Não segui o seu conselho, mas ainda hoje sinto que aquela conversa foi uma espécie de missão, uma missão de amizade, um gesto que gostaria de, um dia, poder ter com os filhos dos meus melhores amigos. NCS

sexta-feira, agosto 29, 2003

Render-se à vida 

Às vezes, tenho de repetir para mim próprio que o tempo é contado de forma crescente – 1h, 2h, 3h, 4h… Conformei-me demasiado à contabilidade do contra-relógio, como se Kronos, afinal, corresse apenas pensando na morte.
O “enquanto não” de Heidegger ou Levinas está lá – é inevitável e inesquecível – mas deve aparecer-nos só diante das grandes questões acerca das escolhas que decidem a nossa vida, isto é, não pode dominar todos os dias em que o sol faz o favor de nascer. Entregarmo-nos à diabólica mecânica de despachar qualquer coisa até ao fim do mês para, depois, poder começar aquilo em Setembro, porque em Outubro temos de ir para não sei onde, pode, muito bem, servir apenas para encurtar esse “enquanto não”.
Não me parece verosímil que o discurso publicitário possa resolver um problema filosófico, mas recordo-me de um anúncio da Rover, com algum tempo, em que a voz-off respondia à pergunta por três desejos: andar na mais bela estrada do mundo (o que era acompanhado pelas imagens de um veículo da marca deslizando, silenciosamente, por uma via magnífica pela margem de um lago, possivelmente, suíço), um segundo de que não me recordo e um terceiro: ter tempo, muito tempo para os amigos. E, aí, víamos o plano abrir-se a partir de uma mesa de fim de refeição ao ar livre, rodeada de homens e mulheres felizes e calmos, para uma quinta imensa, em final de dia, a perder de vista.
O spot tinha a peculiaridade de bom gosto de o seu clímax nada ter a ver com o produto que anunciava e encantava por essa bela representação da alegria de ter tempo. Tempo para o que se quiser, para nada em especial, tempo que não vem antes de nada, que é apenas tempo, à nossa frente.
O que temos no pulso são relógios e não cronómetros. Temos de aprender a desfrutar das opções tomadas, a tirar verdadeiro prazer daquilo que decidimos fazer, em vez de pensarmos que, se falharmos um prazo, nos espera a Sibéria. A contagem final era apenas o nome de uma música foleira, não é nenhum desígnio divino e a vida humana, felizmente, não se mede em horas ou dias, mas em anos e décadas. Com sorte, o tempo nem mata, mas eterniza.
AB

Cruel amor, a quanto obrigas os corações mortais! 

É a tradução para português do nosso latim de cabeçalho. JPH, diga à Maria que isso da foto é muito impessoal - encontramo-nos um dia destes no Snob, que tal? Como já escreveu e bem, chamamos à liça os senhores Justerini e Brooks e pensamos em coisas mais interessantes para este intercâmbio electrónico, ok?
Desculpe a ausência de links. Enquanto não regressar ao PC de Lisboa vai ser assim. LFB

Invejo estes gajos 

nota prévia: os meus amigos sabem que sou um refinado lamechas. Hoje aproveito para roubar a rubrica ao Tiago mas para um bom motivo, creio bem.

1. Invejo o Tiago Rodrigues:
porque tem a mesma idade que eu e um currículo maior, porque é um líder natural e eu não, porque concretizou o meu sonho maior: é pai. Ainda por cima da Beatriz, uma futura top-model que ele produziu com o toque de Midas da Magda, proprietária da mais espantosa gargalhada do mundo conhecido. Invejo ainda o Tiago porque ele faz com uma bola aquilo que só consigo fazer no Fifa2003 quando controlo o Figo. Mais ainda, mark my words, este gajo é um dos maiores actores portugueses (quem já o viu nos STAN sabe disso) e agora veio trabalhar comigo para me lembrar que não sou o único a sonhar com uma carreira de actor/argumentista. Invejo-o porque escreveu os poemas mais poderosos que li no século XXI e têm vergonha de os mostrar enquanto eu edito por dá cá aquela palha. Invejo-o porque o padrinho dele foi o Assis Pacheco e quanto ao meu nem me recordo do nome. Invejo-o porque vamos fazer uma data de coisas grandiosas no futuro e depois, nas entrevistas, ele é que vai sacar as frases definitivas.
Pronto, já chega! Agora vê mas é se escreves mais.

2. Invejo o Joel Neto:
Porque escreve como nunca serei capaz; porque casou com a Estela que é das poucas pessoas a quem o adjectivo "maravilhosa" assenta bem; porque tem um abraço mais forte que o meu; porque a gargalhada dele tem o condão de nos fazer felizes; porque andou de mota (sem carta!) no Burkina-Faso; porque atravessou os EUA de automóvel e eu fiquei-me pela leitura do "On the Road" (aos 24 anos...); porque é melhor guarda-redes que eu; porque o gajo é da Terceira e, enquanto for vivo, não terei hipóteses de ser o tipo mais brilhante do raio da ilha; e porque anda a provocar-me para pequenas polémicas a que miseravelmente não consigo responder.

Chego a Lx na segunda. Vamos jantar e, porra, vejam lá se me tiram esta mania de gostar tanto de vocês. LFB

quinta-feira, agosto 28, 2003

PREGÃO DOS SONHOS E DAS BORBOLETAS 

Escrevia assim o Senhor Visconde Victor Marie Hugo:


Le papillon et la fleur

La pauvre fleur disait au papillon céleste:
Ne fuis pas!...
Vois comme nos destins sont différents, je reste.
Tu t’en vas!

Pourtant nous nous aimons, nous vivons sans les hommes,
Et loin d’eux!
Et nous nous ressemblons et l’on dit que nous sommes
Fleurs tous deux!

Mais hélas, l’air t’emporte, et la terre m’enchaine.
Sort cruel!
Je voudrais embaumer ton vol de mon haleine.
Dans le ciel!

Mais non, tu vas trop loin, parmi des fleurs sans nombre.
Vous fuyez!
Et moi je reste seule à voir tourner mon ombre.
A mes pieds!

Tu fuis, puis tu reviens, puis tu t’en vas encore
Luire ailleurs!
Aussi me trouves-tu toujours à chaque aurore
Tout en pleurs!

Ah! pour que notre amour coule des jours fidèles.
Ô mon roi!
Prends comme moi racine ou donne-moi des ailes
Comme à toi!


Uma pequenina maravilha, sim. Mas alguém houvera de ter dito à “pauvre fleur” que contentar-se com menos sempre seria uma forma de felicidade.

Sejamos pragmáticos: se não se contentassem com o menos que podem ir catando do chão ou do lixo, viveriam as gentes de hoje descontentadas com o mais que só sonham ou desejam, e amarguradas de grilhetas pesadas e correntes.

E, afinal, quem quer isso? Quem quer uma vida toda de sonhos por realizar e borboletices e desejos por satisfazer? É pregão que não chama ninguém à janela.

Só as pobres flores de oitocentos sonhavam ainda, e lá iam apostrofando as borboletas. Pobres, desgraçadas flores. LDA

Seria mais fácil se fosse vermelho? 

Acabo hoje, por fim, o primeiro caderninho preto que me ofereceu o Joel. Andei anos com A4s e A5s atrás, blocos de notas sem linhas e folhas de papel avulsas, até que um amigo com verdadeiro sentido prático me ajudasse. Levei demasiado tempo a acabar este pequeno livro (tamanho A7, julgo eu): um ano e uns dias… Ou ando com poucas ideias ou, simplesmente, já selecciono melhor o que deva ser escrito e aquilo que a própria memória se encarregará de deixar para trás.
Agora, confiro a primeira página e vejo que o comecei a 6 de Agosto de 2002, num café da Horta, tomando notas para personagens de uma estória ainda não pensada, a partir de pessoas reais desse Verão: entre outros, uma socióloga francesa que passara o seu mês de férias no Corvo e um filipino com dois metros de altura, tocador de “jambé” (será assim que se escreve?) pelas festas da Terceira.
Como quase tudo o que está no caderno, nem esta primeira ideia dele chegou, até agora, a sair e, na passagem para o segundo volume, o drama aumenta dentro de quem o escreve. Tem milhares de anotações e ideias, mas não é capaz de tomar a decisão de pôr de lado um pouco da “everyday life” para se sentar a escrever, a sério, um romance.
AB

tic, tac 

Uma das melhores coisas dos blogs é que, depois de cada post, aparece a hora em que ele foi colocado. Por mais que se queira parecer um exausto mas imparável master of the universe, saído de uma maratona social nocturna, o post não deixa: lá estará, imperturbável, a indicação "2:34 PM", a impedir a mentira razoável, por mais que se quisesse por "7:49 AM"...
E não se escreve da mesma maneira às sete da manhã ou às dez da noite... Não haverá por aí um sociólogo solitário que queira fazer esse estudo entre os nossos posts? MR


heartbreak hotel 

Caríssima MJO, não tive oportunidade de lhe agradecer a extrema simpatia para com o DC na sua Gazeta dos Blogues.
Respondendo à questão, apesar de não ver a malta há quase um mês penso que sou, de momento, o único solitário de serviço. Diga a JPH que não percebi a conclusão dele mas não faz mal. Quero namorar é consigo. LFB

11 notas sobre futebol porque a bola é redonda 

1. O meu Benfica fez-me sonhar durante trinta minutos. Muchas gracias.

2. Todavia, Cristiano nunca será Schwarz, Petit nunca será Paulo Sousa, Roger nunca será Isaías, Geovanni nunca será Paneira, Argel nunca será Ricardo Gomes, Hélder nunca foi Mozer, Fehér nunca será Rui Águas.

3. Sr. Scolari, quando acabar de medir o seu instrumento sexual com José Mourinho, faça o favor de convocar Moreira, o guarda-redes português do futuro.

4. Moreira, 21 anos, é o mais antigo jogador do plantel benfiquista. Os desafios com a Lazio foram os seus primeiros jogos a nível internacional.

5. Miguel é sublime, é matéria poética. À atenção de Manuel Alegre.

6. Este Benfica tem 5 ou 6 jogadores de classe mundial. 2 estão lesionados. Nada mais. Se o físico permitir, Sokota será o melhor jogador do campeonato.

7. A Lazio é um grande clube e um justo vencedor. Pena que um jogador seu se permita o desplante de jogar com uma garrafa de água na mão. A classe, de facto, não se adquire.

8. O Benfica será segundo na SuperLiga, muito distante do Porto. Vencerá a Taça de Portugal. Perderá ingloriamente nos quartos-de-final da UEFA.

9. Sexta-feira, o Porto de Mourinho, a única equipa portuguesa capaz do fantástico, derrotará o Milan. Para quem ainda não percebeu, Deco provará ser hoje muito melhor jogador que Rui Costa. Este fará as malas para regressar ao Benfica. Não corre mais que Zahovic, mas tem a vantagem de ter coração.

10. Caro Mourinho, desta vez - quando agarrar um italiano em vias de se desmarcar - sirva-se de uma garrafa de água e aplique-lhe um valente clister. Em nome do asco que a arrogância bacoca destes italianos nos provocam. Vitória moral: são um dos poucos países europeus mais patéticos que nós.

11. Gosto de futebol por dois motivos perfeitamente paradoxais: porque é possível que o herói de um dia humilhe o tradicional Golias;

e porque, quase sempre, isso não acontece. O futebol recorda-nos, amiúde, que a vida é dura. Que uns são infinitamente mais talentosos que outros; que o Benfica, por exemplo, não voltará a vencer taças internacionais; que os heróis de um dia escasseiam. Depois deste jogo, sou "ainda mais" do Benfica. Porque gostei de ver uma equipa de homens comuns, de Anderssons e Rochas, utilizar as suas fisgas contra paredes de aço enquanto fingiam todos juntos e em silêncio que era esferovite. LFB

quarta-feira, agosto 27, 2003

Back to the future IV 

Para quem, como eu, tem vivido os últimos meses entre o final do século XVIII e a primeira metade do século XIX, com umas incursões quase a raiar a Primeira República, regressar de vez em quando a 2003 pode ser complicado. Não se sabe muito bem o que dizer ao telefone, às poucas pessoas que ainda vão ligando. Passa-se a escrever de uma maneira esquisita - collecção, leys, officiaes, he, á... Tudo parece aqui, em 2003, muito rápido e muito em vão. Muito simples. Muito longe.
Nunca falei tanto comigo como nestes tempos de tese, mesmo estando caladinho nas bibliotecas. Zango-me a sério, comigo. Dou-me conselhos amigos e ordens secas. Incentivo-me a fazer e a não fazer. Se calhar, ainda vou ter saudades destes meses, que parecem complicados, mas são suaves e doces, porque se vivem sempre por entre descobertas sorridentes ou silenciosas, mas sem mágoa.
Sinto-me também um intruso, um vizinho chato que não só faz barulho de madrugada como se põe à nossa porta para saber tudo. Sinto-me um devasso, a mutilar o socego (vêem?), o sossego, daquela gente pacífica e morta. Só de vez em quando sei que tenho resposta, que me entreabrem a porta para me dizer qualquer coisa de fugida. Como um ditado que me contaram, ontem à noite, e que acho que posso partilhar:

"Na boca das mulheres o segredo he como a agua, que chove nos telhados; passa de telha em telha, até que finalmente cahindo no chão por toda a parte se derrama. As mulheres guardão o segredo de tudo o que não sabem."

Muito machista, muito aborrecido? Não, nem pensem nisso - é a doçura do tempo passado a dizer uma piada, como se estivesse a jantar com o Bluteau e ele tivesse bebido um copo a mais, como se tivesse pedido outra caipiroska e ajeitasse a cabeleira enquanto fumava um cigarro. Os papéis velhos piscam-nos o olho e nós temos de dizer que sim, que acenar sorrindo, e só voltar a página depois de um abraço sentido e uma palmada nas costas. MR

Obrigado, Avó, pelas vezes em que me fizeste ouvir o LP 

Algumas noites atrás, ouvindo um programa nocturno da Rádio Seixal (sim, aquela que, pelo menos, há uns anitos, tinha uma canção matinal anti-stress rodoviário, cujo inesquecível estribilho dizia mais ou menos a seguinte pérola da rima lusitana: “Com a Rádio Seixal / lárálá / Nada pode correr mal / lárálá-lálá-lálá) cujo nome me pedem para não divulgar porque, percebo, é uma pérola que os conhecedores desejam manter privada, tive um súbito flashback… Há quanto tempo não ouvia a voz de Raul Solnado cantando aquilo? E, de novo, repenso o post de há poucos dias: será também Solnado um visionário?
Para os mais saudosistas, aqui fica o refrão: “Português, ó Malmequer, / em que terra foste semeado? / Português, ó Malmequer, / cada vez andas mais desfolhado…”
AB

Esclarecimento quanto a uma inocente nota de JPH no GLÓRIA FÁCIL 

Quando este blog foi criado, há quase 3 meses, além dos 2 casados todos os membros da equipa tinham namoradas(o). LFB

MEDO 

gostava de deixar de escrever muito cedo e muito novo como rimbaud
a ouvir uma moonlight sonata

podia ser a de beethoven
e a ler um poema teu

escrito quando eras ainda menina

Sobre a lua.
LFB

SOLIDÁRIOS COM O "POSTO DE ESCUTA" 

Nota: Marcamos hoje, 26 de Agosto, o quinto mês de actividade do Posto de Escuta. É essa uma das razões pelas quais não podíamos estar mais revoltados por hoje termos conhecimento de uma tentativa de plágio da nossa página. A página em questão ultrapassa o uso normal (ex. Metablogue) do conceito por trás do 'Posto de Escuta' e faz uso ilegítimo não só da descrição da nossa página (criada por nós a 26 de Abril de 2003) como também de algumas das citações que diariamente seleccionamos. O próprio título e endereço dessa página são elucidativos da óbvia tentativa de associação e identificação com o Posto de Escuta.

Decidimos publicar esta mensagem aqui pois na altura em que o fazemos não existe em nenhum local da página qualquer referência ao(s) seu(s) autor(es) e/ou forma de entrar em contacto com este(s).
O plágio é algo de que, cremos nós, ninguém gosta de ser alvo. É por esse motivo, e para evitar a confusão de alguns visitantes, que achámos necessário este esclarecimento.

A Equipa do Posto de Escuta
postodeescuta@hotmail.com

terça-feira, agosto 26, 2003

Adeus 

Afazeres diversos fazem-me necessariamente ter que afastar dos blogs por tempo indeterminado.
Pode ser que volte, pode ser que não.
Pode ainda ser que crie um blog específico dedicado à Arquitectura, ou volte, caso matenham esta possibilidade, aqui aos meus caríssimos amigos.

Entretanto, bons abraços a todos e permaneça o mistério. BR

Tive algumas reacções em blogs e mails ao post A Urgência da Fala, aqui ficam alguns dos links que me lembro, outros emailem a malta e possivelmente terão voz.
assumidamente, terras do nunca, marretas, Homo, pegada, acho eu.

Who cares about the name?! Explica lá mas é o truque!! 

Sean Connery fez ontem 73 anos e eu tenho raiva dele. Em jovem, quase era mister universo, mas, ainda há dois ou três anos, um conjunto de revistas femininas consideravam-no o homem com mais charme do mundo. Foi agente secreto, historiador e aventureiro, astronauta, imortal, escritor e fora-da-lei de classe. Passeou pelo universo futurista, pela Idade Média, pelos braços de milhares de mulheres incríveis e tem a lata de não se retirar: em poucas semanas, aí estará ele, nos nossos cinemas, disfarçado de super-herói… Quando é que te sentas um bocadinho, Sean, e explicas à malta nova, afinal, como é que se faz?
AB
PS: Entretanto, Catarina Furtado fez 31 anos e Cláudia Schiffer 33. Se é de charme que estamos a falar (coisa cheia de sexo, mas independente de qualquer um dos dois específicos) e correndo o risco de parecer um bocado abichanado, não lhe chegam aos calcanhares…

Susto II 

Continuo com o Blogger mais ensarilhado que as gravatas do Mário Crespo. Por isso resolvi deixar-vos mais dois poemas e regressar ao DC às tantas da manhã para vos dar conta do mais perturbante texto que já encontrei na blogoesfera. Assim mesmo, com itálicos. Vão a MUITOMENTIROSO.BLOGSPOT.COM. Mais não digo. LFB

ps: desculpem mas o vírus não me deixa fazer links.

O menino da sua avó 

Uma boa notícia, recebida através do pequeníssimo ecrã. Gosto tanto de Fórmula 1 como o Prado Coelho gosta da blogosfera, mas gostei de saber que o espanhol Fernando Alonso, vencedor do Grande Prémio da Hungria, havia prometido à sua avó que o ia ganhar. Um tipo que procura honrar a sua avó deve ser um tipo decente. NCS

QUESTIONÁRIO A UMA DEUSA 

“Durante quinze dias e quinze noites vivi de música,
e depois descansei durante anos.”
Erik, in O FANTASMA DA ÓPERA, Gaston-Leroux



não consegues ver
que cada cratera da lua
é um atelier onde pintores loucos
desenham a terra nua?
não imaginas nunca
um deus a dormir
no conforto das estrelas
enquanto amamos?
não sabes que as igrejas
são as discotecas dos anjos?
nunca ouviste a porta do teu quarto
ser aberta pelo meu sonho?
nunca acordaste pensando
que te sussurrava um poema?
não sabias que os poemas
são indicações geográficas
para seguir no mapa do teu corpo?
não sabias que há um álbum
de música com o teu nome nas entrelinhas?
sabias que as galerias de arte
continuam à procura do teu sorriso?
nunca viste os demónios e os anjos
a jogar flippers com cometas e estrelas?
não calculaste ainda
que a soma dos quadrados dos catetos
é igual à roupa que já não se usa?
já sabias que o livro perdido por camões
era acerca da quimera das meninas,
as dos teus olhos?
sabias que os homens se reúnem
para discutir a localização do continente do teu coração?
algum dia adormeceste e acordaste com a minha canção?
nunca estudaste na mitologia
os jogos de azar entre gregos e romanos
e a hipoteca do olimpo?
sabias que todas as respostas erradas
estão certas quando as perguntas são raras?

publicado em “Ventana a la nueva poesia portuguesa”/Ed.Desierto
LFB

mini tv rural 

Talvez seja esta a razão que me leva a ter de fugir das cidades todos os anos, durante alguns dias. Nas cidades somos mais pequenos do que as televisões. No campo, olhamo-las de cima. Já sabia disso e tenho-o confirmado por estes dias - entre flores, estrelas e árvores, as televisões perdem importância; ficam mais pequenas. Passamos por elas com a arrogância de quem tem céus para olhar e ares para respirar. NCS

TERRA PROMETIDA 

(Para Mário Cabral, Emanuel Félix e Ivo Machado)

a minha terra prometida tem mais pedras que pessoas
não é fácil achar terras com algo mais do que pessoas

na minha terra prometida,
as pedras tem poemas gravados com palavras de muitas cores
as musas existem de verdade
e estendem a roupa enquanto conversam

há canções de amor na rádio
assim que os amantes os ligam
e há belo amor nas casas
quando o desligam

na minha terra
todos os poetas querem ser astronautas
tiram um curso e vão pular rimas na lua

a rua principal na minha terra é uma imensa pauta com o “hino da alegria”

as promessas cumprem-se nas igrejas
onde se pode dançar na sexta à noite
e os cavalos são animais de estimação
(gostam de comer cenouras que todos cultivam para os bichos)

na minha terra
ficou a minha prometida
desde o dia em que deus meteu o lápis atrás da orelha
e acabou a contabilidade.

na minha terra
há proprietários que dão os seus terrenos
para construir piscinas, muitas piscinas
e lagoas artificiais
que obrigaram à redefinição da palavra “ilha” no dicionário

julgo que a minha terra prometida
é uma ilha cheia de músicos e operários
que trabalham e compõem ao mesmo tempo.

a minha terra tem dois princípios e nenhum fim.
LFB

Preparação para a vida 

Na crónica do DN de sábado, intitulada: “Que é feito da juventude?”, João Lopes, fala da juventude de agora “frenética” que entrou precoce no mundo dos adultos, acedeu ao dinheiro e ao sexo, pois como diria Woody Allen: “um adulto é uma criança com dinheiro” e eu acrescentaria com vida sexual, queimando a preparação da adolescência: uma etapa de dúvidas e de sofrimento.
No olhar magoado das adolescentes das revistas de moda, vê João Lopes, essa anulação da adolescência.
Ouço muito este discurso entre psicólogos, da necessidade de preparar os adolescentes para a frustração e as vozes dos pais a queixarem-se de como é difícil dizer “não” quando os outros pais dizem “sim”.
E, na minha geração, dos trinta, vejo-os adultos, ainda sob esse jugo, o império do consumo e do sexo, que põe as pessoas frenéticas à procura de parceiros que proporcionem consumo, sexo, diversão e vejo relações de puro mercantilismo, puro compromisso, toma lá, dá cá.
E ouço depois a insatisfação, as minhas amigas clamar: ‘Não há homens, os bons estão tomados”, e ouço os meus amigos homens: “já experimentei de todos os géneros, mas ainda não é esta”. E vejo nos jornais que um em cada dois casamentos portugueses dão em divórcio.
E acho que há um nexo de causalidade entre isto tudo: adolescentes impreparados, adultos insatisfeitos, casamentos fracassados, acho que resistir, fazer sacrifícios é um processo que tem de ser maturado, não é agora caso-me e logo deixo de fazer só o que me apetece.
Não é que eu seja moralista, que ache que a felicidade está no casamento, mas se se querem casar e avançar para essa prova de fogo numa era de individualismo, têm que saber que esse é um território em que se parou de viver só para si, e passa-se a viver de negociações, cedências, sacrifícios, resistência.
Lidar com as dúvidas, escolhas, esperas, renúncias, sofrimento tem que ser introduzido e ensinado aos adolescentes antes de se tornarem adultos.
E descubro, insolitamente, este verão, a madrugar e a correr atrás de uma sobrinha de 18 meses que a felicidade não está só em fazer aquilo que nos apetece, em servirmos o eu ditatorial e insaciável que está dentro de nós e que vai crescendo à medida que nos habituamos a viver sozinhos, mas que está também em servirmos os outros, em sacrifícios que são obrigatórios para mantermos aquilo que temos de certo: família ou amigos, nem que seja para essa fugidia ilusão de que somos melhores, ou de que fazemos alguma coisa pelos outros para merecermos viver, nem que seja em troca dessa recompensa de fazer um bem para nos sentirmos bem.
Eu acredito nisto quando na reportagem do Expresso sobre Sérgio Vieira de Mello leio que ele confessou que era no meio dos refugiados, dos perseguidos e dos sem pátria que se sentia melhor e leio estas suas palavras: “continue a fazer o que você faz de melhor: o bem”. CMC

segunda-feira, agosto 25, 2003

A Casa Malaparte, em Capri 

No pequeno barco de pesca contornamos a ilha de Capri. O Steven conta-me que do alto deste penedo o imperador romano disparava os amantes que não o satisfaziam na turística resort de onde destinava as orgias do império. Se a morte não fosse certa como nos narra a lenda, plácidos centuriões sentados no calhau despoletavam a última fresca catanada na aterrada testa de amante incompetente. O Yehuda vai olhando calmamente enquanto exala umas passas de toscanelli, por entre a neblina surge atrás da sua a silhueta da casa Malaparte, estamos a chegar... Parece que na água permanecem umas últimas nostálgicas remadas da fuga odisseica, só o guindastre do Godard ficou teimosamente agarrado à montanha. O sangue que lhe escorre das mãos manchou a casa toda…
Fizemos uma refastelada semana de turismo mental de habitação, piqueniques no solário, sonecas manuseando em segredo podres originais do Séneca. A biblioteca tem olhos de bicho. À noite os rumores dos livros lembram os de uma floresta. Da lareira vê-se na sala o sítio onde ardem ao sol as replastificadas banhantes de elite acompanhadas. Desenho-as para me entreter demasiadamente gordas e bafulentas à laia de uma qualquer destinação. Aprendi acerca desta casa que o jornalista de guerra Curzio criticou a gravata do Mussolini e fez umas férias prolongadas com trabalhos forçados literários. Uma espécie de desterro sentimental onde “o desprezo” distanciado pelo comum se revigorava em golfadas de exercício matinal no terraço. Alvo, na farda e no olhar cobiçeiro das irrequietas casadoiras da ilha.

O turismo do intelecto ilumina a baía toda. A Brigitte deu um mergulho mais onírico numa outra vaga qualquer, só lhe vi a sombra no fundo do embarcadouro. Sempre foi muito dada.

Lanchámos com um actual turista residente em tempos percurssionista com o John Cage este em tempos baterista turista do seu tempo estagiário furtivo em regime club Med na casa-estância Schindler em LA pela mão da própria Madame. Lembrei-me que este nunca viveu no Chelsea Hotel.. Foi sim amigo do Duchamp que tinha um ‘time-charing’ bem perto da rua 14, em Washington Square, NY. O turista profissional segundo Breton foi o Homem mais inteligente do século (vai dar ao mesmo, vejam:“o meu trabalho é respirar” querem mais sublime?).
Noutro penedo da ilha sentou-se em férias Rainer Maria Rilke a escrever, farto da estância de marfim onde chulava mais uma condessa para se inspirar e fingir dor. BR
(de uma visita com Steven Holl e Yehuda Safran de NY à Casa Malaparte em 1999)

Eu Acho Que...Eu Penso Que... 

Como poderá espantar alguém que Portugal seja o País que mais consome telemóveis e blogs? E ao mesmo tempo ser um dos mais atrasados e estúpidos Países ocidentais?
É preciso não esquecermo-nos que é em Portugal que toda a gente é um especializadíssimo Expert em o que quer que seja que se esteja a falar ou discutir ou a acontecer e as horas de opiniões e achos ques desvelam-se eternamente nas televisões, nos jornais, nos cafés, nos átrios das empresas e esquinas deste subúrbio da Europa.
Enquanto isto, pessoas sem tantas opiniões e sem tantos dizerismos, em todos os outros países, simplesmente trabalham.
Já repararam como o Português está sempre indignado? Sempre a bitaitar contra o vizinho?
Dito isto....vou ali trabalhar e já volto. (calma, respira fundo...)BR

Pena da morte? 

Tento perceber o que significa o assassinato do padre John Geoghan e não sou capaz de o dizer. Recebo a notícia sem a menor alteração de emoções, como se duas experiências malignas se anulassem mutuamente, ainda que qualquer coisa na consciência me pareça exigir uma posição moral sobre o facto.
Geoghan, a raiz da versão norte-americana do escândalo da pedofilia, cumpria seis anos de pena por uma acusação insignificante à luz das cento e trinta de que era alvo, tendo precipitado cerca de trezentas resignações entre padres de Boston. Só tinha cumprido, ainda, um ano na prisão e, agora, é assassinado por Joseph Druce, um condenado a prisão perpétua cujo crime os jornais não se ocupam, sequer, em revelar.
Fez-se justiça? Se Geoghan vivesse no Texas e tivesse sido, desde o princípio, condenado à cadeira eléctrica, a sucessão de acontecimentos pareceria mais lógica e, consequentemente, mais tranquilizadora? Ou, pelo contrário, deixar-nos-ia insatisfeitos com a instantaneidade do castigo perante a duração do crime? Ou revoltados com haver ainda estados ocidentais a praticar a pena de morte?
Druce, um criminoso, com certeza, terrível, matou um homem cujo crime parece não caber debaixo do manto da lei. E agora? O que se lamenta e a quem se perdoa?
AB

O Nome das Coisas 

Em 1976 Sophia de Mello Breyner Andresen escreveu o poema "Açores". Na primeira quadra pode ler-se: "Há um imenso orgulho / Na palavra Açor / E em redor das ilhas / O mar é maior." Mais à frente: "E foi na Terceira / Com o mar à proa / Que nasceu a mãe / Do poeta Pessoa." Para terminar: "Poema onde está / A palavra extrema / Que une e reconhece - / Pois só no poema / Um povo amanhece." HR

À mesma hora 

"Meio-dia. Um canto da praia sem ninguém.
O sol no alto, fundo, enorme, aberto,
Tornou o céu de todo o deus deserto.
A luz cai implacável como um castigo.
Não há fantasmas nem almas,
E o mar imenso solitário e antigo,
Parece bater palmas."
(Sophia de Mello Breyner)

O verão no seu fim.
HR

Susto 

Caros amigos,

não sei se apanhei a mesma maleita que o Pedro Mexia mas certo é que fui visitado por um vírus e tenho o Blogger parecido com o cérebro de João Jardim, uma trapalhada. Não consigo escrever em condições ou fazer links por isso, e enquanto espero que a gripe passe, deixo-vos dois poemas directamente da gaveta para começar a semana docemente. Desculpem se este post sair truncado. LFB

PLATÓNICO 

eu sou a mulher dele
ela disse

viu-o passar de carro, sorriu-lhe
e disse

com carinho e um contentamento tal
por essa posse declarada

- ser a mulher dele

que foi nesse preciso momento que me apaixonei por aquela mulher

por aquela mulher casada, com trinta e dois anos, e duas filhas
por aquela mulher inteligente, com sentido de humor, belíssima

a mulher dele

foi nesse preciso momento e durante o tempo que durou o nosso encontro

que a amei


e ele, o homem dela,
tal foi a ternura com que ela o referiu naqueles breves segundos


nunca consegui odiar
amei-o também.
LFB

CORTO MALTESE 

há uma história que se conta, ainda hoje
sobre um defunto a quem foi erigida uma estátua

ele gostava muito de fumar charuto

e então, para completar a homenagem,
os seus amigos e familiares mantiveram aceso,
durante décadas,
um charuto que essa estátua ostentava numa das mãos.

imagino que os olhos da estátua em tamanho natural
são de corto maltese
e que os olhos dele, raiados de sangue
e com uma lágrima de pedra e outra de diamante,
miram não uma, mas duas luas
e que não uma, mas ambas, falam com ele.
LFB

domingo, agosto 24, 2003

Nota dominical 

De vez em quando há dias destes. Termina o copo d'água, os convidados saem amparados uns nos outros, os noivos retiram-se mais cedo para a lua-de-mel, a dama-de-honor vai para um hotel com o irmão do padrinho do noivo... E fico cá eu. Escrevo-vos na mesa do brinde, entre cabeças de camarão e nódoas de chantili. Desapertei a gravata, liguei o portátil, e vim assegurar-me de que o DC não passava um dia em branco.

Notas importantes:

a) a todos os que nos têm escrito, muito obrigado e - por favor - compreendam se a resposta demorar uns dias. Tentamos responder a toda a gente mas é possível que já tenha escapado um ou outro. Além disso (e felizmente) o número de mails continua a aumentar e por vezes não é fácil dar conta do recado;

b) quanto à questão dos comments, que continua a ser colocada, ainda não há fumo branco. Temos uma equipa grande que, apesar de acreditar nos méritos da democracia, tenta resolver as questões sempre pelo critério da unanimidade. Até ao momento a única decisão unânime é a de que o recurso aos comments no DC será sempre uma opção temporária. Just to have a taste of it;

c) preparamos algumas novidades para Setembro nomeadamente a entrada de um ou dois novos casadoiros, uma ela e um ele. Este último residente na Alemanha o que aumentará sobremaneira o mapa dos nossos cronistas. No finalzinho do mês e do Verão, acontecerá a primeira festa DC num bar de Lisboa para a qual estão desde já todos convidados. Por fim, há uma terceira novidade para Setembro mas é surpresa. Aqui ficam umas reticências de perturbante suspense...

Agora vou pegar no que resta do champanhe e brindar aos meus amigos do DC. Tenho saudades vossas, pessoal. Vemo-nos daqui a uma semana! LFB

quanto não tem nada para dizer, cite 

Roubo a rubrica a AB para vos deixar um curto diálogo entre Glória e Pedro Juan, personagens de "Animal Tropical" - Pedro Juan Gutierrez:

Gloria - Vou viver contigo para a quinta!
Pedro Juan - Mas tu não sabes ordenhar.
Gloria - Não pode ser difícil, papi. Deve ser como bater punhetas a um anão. LFB

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